Entre os integrantes da frente suprapartidária de combate à corrupção e à impunidade, Jarbas Vasconcelos (PMDB-RS) foi enfático no apoio à presidente Dilma Rousseff para que ela amplie a faxina no governo. Único peemedebista contrário ao governo, o senador completa 69 anos terça-feira, data da primeira reunião da frente suprapartidária na Comissão de Direitos Humanos do Senado. Em entrevista ao GLOBO, Jarbas avalia que Dilma busca se diferenciar do ex-presidente Lula e prevê um conflito entre 'criador' e 'criatura' para a disputa na eleição presidencial de 2014. 'A corrupção está incorporada à paisagem brasileira. É como se fosse um outdoor e já está generalizada no governo'.
A frente contra a corrupção vai crescer?
O movimento só se consolida e só se expande se a presidente tomar uma medida uniforme com relação a todos os partidos. Não adianta ela fazer o que fez com relação ao Ministério dos Transportes e ficar de faz de contas em relação aos outros. Dilma só consolida essa posição dela, que é uma posição louvável, se ela tiver apoio da sociedade, das entidades, da mídia e do Congresso.
Deveria haver uma medida mais forte por parte de Dilma?
Mais forte e para todos. Ela não pode deixar de lado porque tal partido é grande, ou porque pertence a ele, no caso o PT. Ela tem que enfrentar isso de maneira firme, determinada e com a conduta uniforme. Ela não pode estar com um peso para um e uma medida para outro
Por que é difícil maior adesão de parlamentares?
Primeiro, por acomodação. Segundo, compromisso com cargos, emendas. Não querem contrariar o governo. Acham que fazer parte de uma frente dessas, só depois de consultar a presidente. Mas o que a gente não pode é esmorecer. No combate à corrupção, ela tem de exercer a autoridade dela de forma clara, transparente e linear. No Congresso, uma grande parte que é fisiológica não apoia.
Quatro ministros já caíram, três por denúncias. Dilma está colocando o dedo na ferida?
Para mim, era previsível. Eu tinha para mim mais ou menos essa previsão, porque ela tem um conceito, a conduta e fama de durona. Eu achava que, se ela enveredasse por essa formação dela, essa formação de não conviver com o malfeito... eu acho que em determinados momentos ela iria enfrentar isso. Enfrentar isso tem muitas contradições e muitos problemas para Dilma. Primeiro, porque é uma herança de que ela participou. Ela também criou essa herança. É uma herança maldita que veio de Lula, mas de que ela participou, porque foi chefe da Casa Civil. Ela presenciou (o fato de) que Lula alisava, passava a mão na cabeça de corruptos. Lula convivia bem com mensaleiros, Lula amparou e defendeu os aloprados. Sempre saiu em defesa de Sarney. Na crise de Sarney, ele se colocou à frente dizendo que Sarney era uma pessoa diferenciada. Tudo isso, ela presenciou.
Onde Lula errou?
Ele é marqueteiro. É homem de palanque. E chegou a índices de popularidade incríveis. Lula se considerou, no governo e agora fora do governo, uma pessoa que está acima de tudo. Acima da Constituição, acima da Justiça, acima do Congresso, acima das pessoas. Quando Lula diz que essa questão de formador de opinião pública é uma balela, que não existe, ele incorre em um grande erro. Todo país, toda cidade, todo estado, tem formadores de opinião pública. Ele alcançou uma popularidade tal que se dá o luxo hoje e o desplante de enfrentar TCU (Tribunal de Contas da União), a mídia de um modo geral, de desqualificar denúncias. Ele tinha força para isso. A Dilma não tem ainda. A Dilma está longe, muito longe de chegar a uma posição de Lula. O Lula enveredou por um caminho errado, de proteger. O erro dele foi esse aí.
A corrupção está centrada nos ministérios ou presente também em outros órgãos?
Ela é generalizada. É uma avaliação incorreta dizer que o Lula, o PT, ou os dois juntos inventaram a corrupção. A corrupção sempre existiu. Só que Lula foi benevolente. Lula foi eleito em 2002 em cima de duas bandeiras, de duas pernas: uma perna que era a da ética e outra que era a das mudanças. Lula nem promoveu mudanças e deixou a ética de lado, abandonou a ética.
Dilma está esquentando a cadeira para Lula?
Não, não. Eu acho que ela vai ser candidata. Acho que ele é candidatíssimo, se não fosse, não estaria andando pelo país inteiro. Ele está com um comportamento de candidato. Se ele não quisesse antecipar eleição, ele não estaria andando como está andando, ele estaria mais recolhido como ex-presidente da República. Ele tá em plena campanha! Ele deve estar com isso na cabeça, de voltar. E ela, eu acho que ela está querendo criar um estilo próprio, porque ela não tem como e ela não vai chegar nunca aos índices de popularidade de Lula, que fazia o que queria e a popularidade dele não era sequer arranhada. Eu acho que vai ter um conflito, mais cedo ou mais tarde, é muito cedo ainda, com o desejo dele de voltar à Presidência em 2014 e o desejo dela de permanecer no poder, de querer se reeleger.
Ela disputa então a eleição de 2014?
Ela é candidatíssima. Para isso, ela só tem que fazer o que está fazendo. Ela tem que se diferenciar de Lula. Aí você percebe que é um mundo de contradição. É um mundo de choque. Ela até agora está tirando ministros que eram ligados a Lula, eram indicações de Lula. O (Antonio) Palocci, o (Wagner) Rossi eram pessoas ligadas e indicadas por Lula. Ela sabia que não podia ter uma conduta como teve com relação ao Ministério dos Transportes e mudar a conduta com relação ao PMDB, só porque o PMDB é maior, bem maior do que o PR.
O senhor já declarou que o PMDB é um partido corrupto. Esse é um dos problemas do governo?
Hoje não é nem o PMDB. A corrupção está instalada em todos os lugares. É a política do toma lá, dá cá. Tem uma coisa importante nisso tudo aí, que é a reforma política, que ficou de lado. Nós estamos terminando agosto e entrando em setembro, para fazer PEC, modificar normas eleitorais, a gente tem que fazer até um ano antes da eleição. Esse prazo se extingue daqui a 40 ou 50 dias no máximo, no começo de outubro. Vamos ficar sem reforma política, vamos disputar eleições para o ano, e depois em 2014, com essas regras.
A reforma política não sai?
Não sai porque o Executivo não teve interesse. Ela está repetindo erros de governos anteriores. Não estou nem me referindo a Lula. Ou você faz isso no começo, ou não faz mais. Ela está terminando o 8º mês e não fez. Acabar com coligações e eleições proporcionais, essa história de votar em José e eleger Emanoel, isso beneficia as legendas de aluguel. Esses pequenos partidos que infernizam a vida de qualquer país que queira se livrar da corrupção.
O senhor foi favorável à CPI da Corrupção. É um caminho?
Sinceramente, não. Mas ela tem que ser formalizada. Porque se criou um hábito de que o governo não quer CPI. A CPI da Corrupção é a favor dela (Dilma), ia ajudá-la, já que não quer conviver com corruptos. A corrupção está incorporada à paisagem brasileira. É como se fosse um outdoor. O medo que faz é a população se acostumar com isso.
O que pode ser feito de concreto pela frente suprapartidária?
Tenho algumas ideias. Primeiro, acho que isso tem de ser levado à frente e se aproximar da sociedade organizada. Depois daquela denúncia contra o meu próprio partido, o PMDB, apresentei um projeto de que todas as diretorias financeiras e órgãos de ministérios e de estatais, a diretoria financeira não podia ser indicada por partidos políticos, teria que ser de funcionários de carreira, proibindo a indicação de políticos. Pode ser feito um pente fino no Congresso para levantar os projetos que possam melhorar o combate à impunidade e à corrupção.
A oposição está enfraquecida ou incompetente?
A oposição está muito reduzida e ainda continua incompetente para fazer oposição. A oposição que não se reúne. No Senado, no ano passado, na única vez em que a gente se reuniu formalmente, o núcleo de oposicionistas, a gente conseguiu derrubar a CPMF, que era para reduzir a carga tributária no país. Então, a gente precisa se reunir mais, conversar mais.
O senhor não se acha fora de moda, senador?
Não, não me acho fora de moda, não, e nem quero ser o Quixote. Não tenho formação para isso: o moralista, o homem que tem a bandeira da moralidade. Não quero nada disso. Eu quero fazer aquilo que minha consciência determina, que minha formação dada pelos meus pais explicita em mim.
MAGNO MARTINS
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